Introdução: Este relato aborda paciente com diagnóstico de Deficiência Primária de Carnitina (DPC), patologia autossômica recessiva secundária a um distúrbio do ciclo da carnitina que resulta na oxidação defeituosa de ácidos graxos. Trata-se de doença rara com prevalência desconhecida no Brasil, ocorrendo em aproximadamente 1:40.000 no Japão e 1:142.000 nos EUA.
Relato do Caso: Paciente 55 anos sexo feminino portadora de doença renal crônica não dialítica, com histórico de depressão maior e tentativa de autoextermínio, vem acompanhamento no ambulatório do miocárdio em 2022 devido dispneia aos moderados a grandes esforços associado a fraqueza muscular crônica de longa data, ganho de peso e edema de membros inferiores. Ao eletrocardiograma ritmo sinusal em eucardia. Ao ecocardiograma apresentava hipocinesia difusa com fração de ejeção estimada em 39%. Realizado diagnóstico de insuficiência cardíaca de fração de ejeção reduzida sendo iniciado losartana, metoprolol, espironolactona e furosemida. Na investigação diagnóstica realizado teste genético evidenciou variante patogênica p.Tyr449Asp em SLC22A5, em heterozigose. O diagnóstico preciso permitiu início do tratamento com L-carnitina 6g por dia, melhorando o quadro sistêmico. O tratamento padrão de ICFER apresentou remodelamento ventricular reverso após 1 ano do diagnóstico.
Discussão: Variantes patogênicas em SLC22A5 relacionam-se à deficiência sistêmica primária de carnitina, defeito no transportador de carnitina de alta afinidade expresso nos músculos, coração, rins, linfoblastos e fibroblastos, o que resulta em oxidação prejudicada de ácidos graxos no músculo esquelético e cardíaco. A descompensação metabólica na infância geralmente se apresenta entre os 3 meses e 2 anos de idade com episódios de hipoglicemia hipocetótica, má alimentação, irritabilidade, letargia, hepatomegalia, transaminases hepáticas elevadas e hiperamonemia. Na vida adulta pode se manifestar com fadiga crônica ou forma assintomática. Pode envolver o músculo cardíaco levando a hipertrofia cardíaca e arritmias. A paciente do caso em questão apresentava envolvimento da patologia em múltiplos sistemas evoluindo com insuficiência renal e miocardiopatia, a investigação através do teste genético permitiu tratamento direcionado à doença de base da paciente e rastreamento familiar em cascata.