Introdução: A cardiopatia por sobrecarga de ferro (CSF) é uma complicação conhecida da síndrome mielodisplásica (SMD), provocada pelas múltiplas transfusões. É considerada uma complicação tardia, mas com alta letalidade se não tratada. Sua incidência tem aumentado junto com a sobrevida dos pacientes devido a melhora no tratamento da SMD.
Relato de caso: Mulher de 61 anos, com diagnóstico de SMD desde 2015, quanto iniciou o tratamento com eritropoetina até 2018. Também não respondeu ao uso da talidomida, sendo a transfusão de hemoconcentrados ainda mais frequente. Fazia também uso irregular do desferasirox, iniciado em 2021. Desde 2019 com queixa de dispneia aos esforços, à época o ecocardiograma transtorácico (ECOTT) já apresentava sinais de hipertrofia ventricular esquerda, disfunção diastólica grau 1, insuficiência mitral moderada e aumento bi atrial, fração de ejeção do ventrículo esquerdo (FEVE) de 73%, holter sem alterações, Ferritina 1039 ng/ml. Em 2020 ECOTT mantinha FEVE preservada e disfunção diastólica grau 2, Ferritina 1630. Perdeu seguimento cardiológico, retornando em 2023 em internação por sintomas de insuficiência cardíaca (IC) descompensada. Agora com FEVE 23%, hipocinesia difusa e VE dilatado na ressonância cardíaca, que também mostrava MAPA T1 reduzido, inferindo CSF, Ferritina 2369 ng/ml. Foi iniciado terapia otimizada para IC, reforçado o uso do desferasirox e iniciado Reblozyl para reduzir a necessidade transfusional. Com o tratamento, a paciente teve recuperação da FEVE para 44% e diminuição das cavidades após 6 meses da terapia, Ferritina 1531 ng/ml. Mas pelo uso irregular das medicações e as múltiplas transfusões, em 01/2024 teve nova internação por IC descompensada com queda da VEFE para 33% e ressonância com MAPA T1 e T2* alterados, recebeu alta após compensação da IC. Mantem seguimento ambulatorial, descartado doença coronariana.
Discussão: Esse caso demonstra a evolução natural da CSF no paciente submetido a múltiplas transfusões e que não trata adequadamente. Dois fenótipos podem ser encontrados, o restritivo e o dilatado, este mais comum. Neste caso de evolução para cardiopatia dilatada, observamos tanto a piora clinica quanto ecocardiográfica concomitante ao aumento da Ferritina (gráfico1).
Conclusão: A percepção do médico sobre esta patologia e manejo adequado da sobrecarga de ferro, guiada pela avaliação do MAPA T2* é a chave para a prevenção da CSF, permitindo que o paciente se beneficie da melhora da sobrevida conseguida com avanço das terapias para SMD.