Introdução: O infarto agudo do miocárdio com supradesnível do segmento ST é comumente interpretado como oclusão coronariana total. Porém, a ausência desse achado ao eletrocardiograma (ECG) pode ocasionar atraso do diagnóstico de oclusão e da devida abordagem. Relato: paciente, sexo feminino, 67 anos, tabagista, portadora de neoplasia de esôfago, apresentou quadro de dor torácica e procurou atendimento em pronto socorro, onde inicialmente fora diagnosticada com infarto agudo do miocárdio sem supradesnível do segmento ST. Transferida para o nosso serviço após 21 horas do ictus e com resolução da dor. Evidenciado valor de troponina I ultrassensível maior que 50.000 ng/L, além de fração de ejeção do ventrículo esquerdo de 40% e acinesia de parede lateral ao ecocardiograma (ECO). O ECG demonstrava onda R ampla nas derivações V1 (3 mm), V2 (11 mm) e V3 (19 mm), tamanho maior em V2 e V3 do que nas demais derivações precordiais, além de infra de ST de 0,5 mm em V2 e 1 mm em V3 e V4, e inversão de onda T em V6, D1 e aVL. Não havia supra de ST em V7, V8 e V9. Consideramos alta a probabilidade de infarto lateral transmural onde a imagem em espelho da onda R ampla de V1 a V3 seria uma onda Q em parede lateral e a imagem em espelho de um supra em parede lateral seria o infra de V2 a V4. Estratificação invasiva demonstrou lesão oclusiva em artéria circunflexa (CX) a qual recebeu angioplastia com sucesso. Lesões residuais foram tratadas após 48 horas e paciente recebeu alta após 5 dias. Discussão: a alteração “supra de ST” não está presente em uma parcela significativa de pacientes com infarto transmural. A artéria coronária mais envolvida nesses casos é a CX, cuja oclusão pode não apresentar supra em até 50% dos casos. Há algumas propostas para melhorar a acurácia diagnóstica: considerar a maior importância do infra de ST de V1 a V4, mesmo na ausência de alterações em V7, V8 e V9, além da associação do achado de R ampla especialmente de V1 e V2, onde não costuma ser proeminente, como imagem em espelho; utilizar ECG de 18 derivações, ferramenta já validada; realizar ECO à beira leito para avaliar especialmente acinesia de parede lateral. Conclusão: a ausência de supra de ST não deve afastar a probabilidade de infarto transmural, especialmente para a CX. Maior cautela deve ser empregada quando há infra de ST de V1 a V4, além da devida atenção a onda R ampla em V1 e V2, esses pacientes têm apresentado um perfil de infarto de maior extensão, insuficiência cardíaca mais avançada e piores resultados em curto prazo.